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Estudo investiga consumo de medicamentos para controle de ansiedade e depressão no campus USP Bauru

As pesquisadoras esperam que, após concluído, o levantamento possa aprimorar o cuidado com a saúde mental dentro da Universidade e subsidiar iniciativas de prevenção, acolhimento e conscientização sobre a importância da prescrição correta e riscos da automedicação

Por Paula Marques*


Foi no olhar atento à realidade em seu entorno que surgiu o interesse de Adriana Calvo, professora da Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB) da USP, em investigar a saúde mental da comunidade interna do campus em que atua, especialmente, o consumo de medicamentos para controle de ansiedade e depressão. A pesquisadora notou que medicações psicotrópicas ganhavam mais adeptos entre seus alunos. “O número de alunos que relatavam tomar algum tipo de medicamento para ansiedade me chamou muita atenção, comparado a anos anteriores, o que piscou um alerta sobre como estava nossa comunidade em relação a isso nesse período pós-pandêmico”.

A percepção da professora não estava errada. O psicanalista Christian Dunker, em aula do curso Divulgação científica para comunicadores e jornalistas, explica que a crise do neoliberalismo, a partir de 2008, com a transformação nos modos de linguagem e popularização da internet, trouxeram uma mutação nas formas fundamentais de sofrer, com ansiedade, depressão, burnout. Com isso, após 2022, as pessoas “passam a demandar transformações em relação a si e na relação que elas têm com seu sofrimento. Então, isso é conexo com a pandemia de covid e os efeitos sociais de isolamento, de recolhimento, de contato consigo, de destruição de laços, mas também de temor ao outro, temor ao contágio, temor à morte, e o luto que atravessou o mundo”.

Há uma crise psíquica na sociedade contemporânea, com fatores relacionados à estrutura de trabalho neoliberal, ao modelo equivocado de manejo de saúde mental e às transformações ligadas à linguagem digital em telas, acredita Dunker. É uma crise de volume epidemiológico: “São números que apontam, de fato, para algum problema”, afirma, ao apresentar um panorama da saúde mental brasileira, que mostra que 9,3% da população sofre com algum transtorno mental, sendo que o Brasil figura em primeiro lugar no mundo em números de ansiedade, e ocupa a terceira posição em diagnósticos de depressão.

Diagnóstico
Diante desse cenário, Adriana Calvo elaborou uma enquete para verificar o consumo de medicamentos para controle de ansiedade e depressão pela comunidade da FOB, da Faculdade de Medicina de Bauru (FMBRU) e da Prefeitura do Campus USP de Bauru (PUSP-B), definindo os medicamentos mais utilizados, prescrição, período e frequência de uso. A proposta ganhou corpo e tornou-se objeto de mestrado de Núbia Alves, aluna da Pós-Graduação da FOB, orientada por Adriana – estudo que também contou com a colaboração de Geórgia Sant’Ana, Gabriela Oliveira, Jorge Carrozza e Carlos Santos.

Núbia Alves, aluna de Pós-Graduação da FOB e autora do estudo. Foto: Acervo pessoal

“O objetivo é fazer um diagnóstico. Queremos saber qual é a frequência do uso desses medicamentos no campus e entender o perfil de quem usa esses medicamentos. Por exemplo: ‘esse uso é feito com acompanhamento médico?’; ‘A pessoa começou a usar antes ou depois de entrar na USP?’. Basicamente, queremos mapear a situação para entender o tamanho desse cenário”, destaca a pós-graduanda.

Para realizar o mapeamento, foi aplicado um questionário online aberto, direcionado à comunidade do campus USP de Bauru, composta por estudantes e servidores (técnicos, administrativos e docentes). Ao todo, 304 respostas foram colhidas e passam, agora, por validação, análise e tabulação dos dados. Embora a pesquisa não esteja concluída, alguns resultados preliminares já chamam a atenção, como o grande número de participantes que declararam o uso de medicamentos para ansiedade ou depressão, dos quais 3,5% admitem não ter prescrição ou acompanhamento de profissionais da saúde.

Próximos passos
Finalizada a análise dos dados, as pesquisadoras esperam que o levantamento possa subsidiar iniciativas que informem corretamente sobre medicação e tratamentos, destacando a importância da prescrição correta e os riscos da automedicação.

“?O mais importante é transformar esses dados em informação útil para nossa comunidade. Queremos apresentar os resultados para a gestão e propor ações práticas de acolhimento e prevenção, ajudando a criar políticas de saúde mental mais eficazes dentro da Universidade, além de conscientizar o público sobre os riscos do uso incorreto desses medicamentos. Para fora da USP, esperamos que essa pesquisa sirva como um modelo. A ideia é que ela possa inspirar outras universidades e outras localidades a fazerem seu próprio diagnóstico. É a ciência saindo dos muros da USP para gerar um impacto positivo e servir de base para o cuidado com a saúde mental em outros lugares também”, encerra Núbia.

 

*Paula Marques é analista de comunicação e produtora da TV USP Bauru. Texto elaborado como TCC do curso de atualização Divulgação Científica para Comunicadores e Jornalistas, promovido pela Escola de Comunicações e Artes (ECA), Superintendência de Comunicação Social (SCS) e Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP, com informações da aula “Crise Psíquica na Sociedade Contemporânea”, apresentada em 20/10/2025 e disponível neste link.