No curso “Divulgação Científica para Comunicadores e Jornalistas”, diante da IA, em vez de eliminar o Victor Frankenstein que possa existir no íntimo de cada um de nós, e temer sua criatura, o professor Glauco Arbix mostra um caminho melhor, o conhecimento – Imagem: Divulgação/Ken Woroner/Netflix
No dia 7 novembro de 2025 aconteceu o lançamento global, pela Netflix, da enésima adaptação de um clássico que resiste em nosso imaginário há mais de dois séculos em infindáveis versões. De livros a filmes, de óperas a videogames, do terror ao humor, os humanos se rendem ao fascínio de Frankenstein.
O diretor Guillermo del Toro reembala e oferta para reflexão do público essa obra que traz um personagem, estranho e instigante, gerado na mente de uma garota mal saída da adolescência no século XIX, Mary Shelley.
A escritora nos apresenta uma criatura feita com peças humanas, braços de um, olhos de alguém, coração de outro, cérebro também. Nasce daí o que de mais grandioso, e ao mesmo tempo assustador, a inteligência humana poderia ser capaz de criar. Um monstro!?
Se isso encanta, e amedronta, o que virá a partir de uma inteligência gerada artificialmente, não apenas pelo pensar criativo de uma Mary Shelley, mas por infinitos pensares organizados por algoritmos turbinados pela “magia” quântica? Que de mágico não tem nada, é ciência.
Contra o medo, conhecimento
Em vez de eliminar o Victor Frankenstein que possa existir no íntimo de cada um de nós, e temer sua criatura, o sociólogo Glauco Arbix, professor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH-USP), mostrou um caminho melhor, o conhecimento. E, de quebra, uniu ciência e jornalismo para essa desafiadora tarefa.
Arbix acalmou nossas angústias pela incerteza do novo durante sua aula “Desafios da inteligência artificial no século XXI”, no dia 15/09, como parte do Curso “Divulgação Científica para Comunicadores e Jornalistas”. Bem antes do monstro de Del Toro aparecer nas telas.
O evento originou-se de uma parceria entre a Comissão Permanente do IntegraCom USP, Escola de Comunicações e Artes (ECA-USP), Instituto de Estudos Avançados (IEA-USP) e a Superintendência de Comunicação Social (SCS-USP).
Ao assumir que a inteligência artificial (IA) está moldando uma nova era em nossa sociedade, presente em quase tudo em nossas vidas, mesmo sem sequer sabermos, o professor Arbix dá a real. “Ela transforma profundamente a forma como vivemos, trabalhamos e nos relacionamos”.
Trata-se de uma tecnologia disruptiva, capaz de alterar não apenas processos produtivos, mas também o modo como pensamos e enfrentamos problemas inéditos. “Estamos apenas no início de um ciclo tecnológico centrado em soluções digitais, tendo a IA como seu motor principal”.
Pontos de atenção
Para o sociólogo, apesar das promessas, a IA traz consigo problemas visíveis e invisíveis. “É um iceberg. Vemos apenas a superfície, enquanto riscos profundos permanecem ocultos”. Para ele, a falta de regulamentação global, com exceção da União Europeia, agrava esse cenário. E, para piorar, “os sistemas funcionam como ‘caixas pretas’, cujas decisões são difíceis de compreender ou explicar”.
Com o advento da IA, o professor Arbix alerta para seis pontos que devem merecer especial atenção, e a maioria deles atinge diretamente o jornalismo: vulnerabilidade dos modelos, concentração de poder em poucas empresas, facilidade de disseminação de desinformação, impacto no mercado de trabalho, mudança na forma de buscar informações e o risco de monocultura jornalística, com conteúdos cada vez mais homogêneos e previsíveis.
Diante desse cenário, a ética no jornalismo torna-se ainda mais essencial. Os profissionais devem ser transparentes sobre o uso da IA, como assistente, nunca como autora. “Ocultar seu uso compromete a credibilidade e empobrece a formação profissional. O futuro do jornalismo está na colaboração entre humanos e máquinas.
Jornalismo sobrevive
Otimista, o professor da USP afirma que nem o jornalismo, nem os jornalistas estão em extinção. “O jornalismo verdadeiro sempre terá foco nas pessoas. Chatbots não são jornalistas. A responsabilidade pela verdade, pela imparcialidade e pela originalidade continua sendo humana. A IA deve ser usada para fortalecer a humanidade, não para excluí-la”, conclui.
O Frankenstein de Guillermo del Toro traz um protagonista mais humanizado, até mesmo em seus retalhos, mas rejeitado. Diante dos aspectos mais nobres da humanidade idealizada, essa exclusão que também ecoa nossos temores com a IA, talvez exista porque o monstro, na ficção, tenha se tornado melhor, infinitamente melhor, que seu criador.
Luís Victorelli é jornalista. Assessor de Comunicação do Campus USP de Bauru. Matéria elaborada como Trabalho de Conclusão do Curso “Divulgação Científica para Comunicadores e Jornalistas”, tendo como base a Aula Conferência “Desafios da inteligência artificial no século XXI” ministrada pelo professor Glauco Antonio Truzzi Arbix. Esse texto contou, intencionalmente, com o auxílio do Copilot, assistente de inteligência artificial da Microsoft, na checagem de dados e refinação de pesquisa.


